A presente obra, publicada no ano 2000, pelo fundador do IPAD no México, Carlos Llano Cifuentes, é, dentre sua numerosa produção, uma importante reflexão para o mundo corporativo. Nele o autor buscou abordar, sob uma análise crítica e construtiva, os benefícios de se criar, no ambiente de trabalho, relações baseadas na amizade, tornando o funcionamento da empresa mais orgânico e mais humano.
Seus treze capítulos poderiam, em um breve apanhado, ser divididos em três blocos. No primeiro, o autor apresenta uma análise histórica da formação das empresas; no segundo, uma reflexão filosófica acerca da amizade e, por fim, uma tentativa de elaboração de um programa de aplicação de sua tese central para as empresas. É aqui também onde aparece uma interessante discussão sobre os modos de como fomentar relações de amizade numa empresa, bem como quais os benefícios que essas relações proporcionam.
Nos primeiros capítulos, Carlos Llano refaz, em linhas gerais, a maneira como se desenrolou um paulatino processo de racionalização da administração de empresas por meio da imposição de regras e protocolos cada vez mais rígidos. Com o fim de se desprender da imagem da típica organização “familiar”, que se ligava à sua origem, esse processo levou ao estabelecimento de relações de trabalho cada vez mais distantes e calculistas. Foi o resultado daquilo que o autor chamou de “Expulsión de la persona”.
Ele destaca ainda como as influências culturais, especialmente as do mundo anglo-saxão, levaram a um agravamento desse movimento. Llano apresenta alguns dados de um estudo realizado em diversos países que avaliava o comportamento de gestores perante situações cotidianas nas empresas. A partir do resultado desse estudo é possível observar uma associação estreita entre posturas mais “distantes” e a tomada de decisões que colocam em risco o bem estar e o desenvolvimento humano das pessoas (para uma consulta detalhada do estudo, ver pp. 158-171).
A primeira consequência do processo de exclusão do componente humano nas relações de trabalho é a perda de potenciais de eficácia, de criatividade e de crescimento, tanto do ponto de vista individual quanto do coletivo. O desenvolvimento dos colaboradores, o que pressupõe as suas virtudes, sua autonomia e capacidade criativa, fica, desta maneira, impossibilitado. Como lembra o autor, toda empresa possui um significativo papel social, e seu trabalho, muito embora gere lucro, tem como objetivo primordial servir à sociedade, gerar empregos e oferecer bens na forma de produtos e serviços.
Assim, quando da constituição e escolha de uma equipe, uma empresa deve comprometer-se também com o seu aprimoramento, para que seus colaboradores possam realizar-se pessoalmente e, principalmente, desenvolver suas capacidades. Essas não se referem a capacidades meramente operacionais, mas a capacidades que se traduzam num efetivo exercício de autonomia na gestão e criação de projetos, desenvolvidos de forma mais completa, comprometida e com maior qualidade. Em outras palavras, a atenção deve voltar-se para o homem ou mulher que exercem a tarefa, e não para a tarefa que o homem ou mulher exercem. É fundamental que o trabalho desenvolvido pelos colaboradores possa torná-los pessoas melhores e mais virtuosas.
Sobre este último aspecto, Llano se aprofunda na análise de como o desenvolvimento pessoal pode influenciar nos processos de tomadas de decisão e de liderança. Quando há autonomia e virtuosidade em uma equipe, as decisões são compartilhadas, isto é, são decididas e executadas em conjunto. Esta maior participação dos membros de uma equipe nos processos de decisão contribui para aliviar a típica pressão presente na direção de cargos executivos mais altos e que demandam maior responsabilidade. Sem dúvida, é reconhecido que o maior envolvimento entre as pessoas de uma empresa proporciona um mais definido sentido de pertencimento.
Nele vemos a história de dois grandes amigos, Saúl Echaury e José Manuel Mestas, que vêem sua relação ser estremecida após um deles assumir um novo cargo na empresa onde trabalham. Apesar de possuírem personalidades e potenciais distintos, ambos haviam se desenvolvido, desde o colégio, através da mútua cooperação e do trabalho em equipe, de forma que os talentos e as limitações de um completavam as do outro. Quando Saúl se torna diretor geral da companhia, porém, sua postura, que já era séria e reservada por natureza, se torna distante, centralizadora e severa, gerando uma má impressão em seus funcionários, os quais passam a fazer comentários maldosos sobre sua pessoa. Percebendo isso, logo José Manuel procura o amigo para alertá-lo, mas é ignorado. Saúl, agora diretor geral da empresa, havia mudado seu olhar sobre o amigo, a quem vê como um “bonachão”, que não compreende a sua posição e as responsabilidade inerentes a ela, e com isso, acaba abrindo mão da sua amizade e dos benefícios que o conselho poderia lhe proporcionar.
No cerne de toda a discussão proposta pelo autor, salta aos olhos uma palavra cujo significado, se pensarmos bem, é forte e frágil ao mesmo tempo: confiança. Ao discutir como a amizade pode contribuir para temperar as relações numa empresa, Llano demonstra como o laço estabelecido entre as pessoas que trabalham num mesmo lugar tem um potencial muito positivo quando sua base é a lealdade e a confiança. Do mesmo modo que acontece entre amigos, quando constroem projetos juntos e compartilham propósitos e responsabilidades, assim também ocorrerá dentro da empresa, onde cooperam e dependem uns dos outros para que algo seja entregue à sociedade.
Para concluir, podemos considerar que Llano dedicou-se a escrever um livro que, em sua essência , questiona a habitual forma das relações de trabalho e demonstra que o potencial humano é a promessa para a empresa do futuro.
Artigo elaborado sob a orientação do Núcleo Humanismo e Empresa.
Originalmente publicado em: https://ise.org.br/nuhem-artigos/la-amistad-en-la-empresa-e-os-beneficios-de-uma-empresa-humanista/


